“Disse Josué ao povo: Santificai-vos, porque amanhã o SENHOR fará maravilhas no meio de vós” (Josué 3:5).
Existe uma santa expectativa nessas palavras. Embora produzam um desejo pela visitação do SENHOR, as palavras de Josué demandam algo, elas esperam do povo uma preparação. Neste sentido podemos lembrar que a fé nos conduz não apenas ao conhecimento, mas a termos nossas vidas transformadas pela Palavra. Como já se afirmou: “A mensagem cristã não é só ‘informativa’, mas ‘performativa'”.
Imagine uma mãe, que na expectativa de receber parentes para se hospedarem em sua casa, mobiliza toda família – marido, filhos e filhas – distribuindo atividades a todos numa santa organização doméstica para receber as visitas. Essa é a imagem que esta passagem das Escrituras procura produzir em nossas mentes, algo mais prático. Talvez esta cena não nos pareça atraente, diante de uma vida cheia de atividades. Pode ser que nem estejamos tão ocupados, mas o chamado para ação surge como uma ameaça ao nosso conforto e marasmo. Uma visita ao fast food sempre nos parece atraente demais, diante da dor de larvar as louças após o jantar. Vivemos dias de imediatos e de imenso conformismo.
No que diz respeito ao culto, a Palavra de Deus surge como um contrassenso à nossa mentalidade pós-moderna. Existe uma demanda divina que nos chama à preparação para os mais diversos atos, seja ofertar (Mateus 5:24), receber os sacramentos (1 Coríntios 11:28-29) e, também, no guardar o Dia do SENHOR (Joel 1:14). Juntamente com o convite à presença de Deus somos solenemente advertidos: “Estejam prontos para o terceiro dia; porquanto no terceiro dia o Senhor descerá diante dos olhos de todo o povo sobre o monte Sinai” (Êxodo 19.11).
Um Deus santo que exige ser adorado em santidade.
Ainda há um aspecto que requer uma reflexão mais profunda – a santidade de Deus. Com efeito, o imperativo para nos santificarmos deve fazer refletir em nós o caráter do próprio Deus (Levítico 11:44-45; Levítico 19:2; Levítico 20:26; Mateus 5:48; 1 Pedro 1:15-16). Um Deus santo que exige ser adorado em santidade. Paulo Anglada nos define o que seria o princípio regulador do culto reformado: “O que não for diretamente ensinado nas Escrituras ou necessariamente inferido de seu ensino, é proibido no culto. Só é permitido no culto aquilo que tiver real fundamentação bíblica”.
É preciso afirmar que só é santo ao Senhor aquilo que Ele determina que seja santo. Deve nos ser estranho que coisas que jamais foram pedidas por Deus sejam consagradas a Ele. Não existe nenhum poder em nós que possa tornar algo santo ou sagrado. Apenas Deus pode pedir que algo seja retirado de seu uso comum e consagrado a Ele (Êxodo 30.22-38). Quando o Rei Davi quis consagrar um lugar para adoração, Deus o questionou: “Em todo lugar em que andei com todos os filhos de Israel, falei, acaso, alguma palavra com qualquer das suas tribos, a quem mandei apascentar o meu povo de Israel, dizendo: Por que não me edificais uma casa de cedro?” (2 Samuel 7:7). O argumento nos parece bem claro: Deus pediu a alguém, ou em algum momento, para fazer isto? Se nossa resposta é não, então, não nos compete fazê-lo.
Deus pediu a alguém, ou em algum momento, para fazer isto? Se nossa resposta é não, então, não nos compete fazê-lo
Nos termos da Confissão de Fé de Westminster encontramos: “o modo aceitável de adorar o verdadeiro Deus é instituído por Ele mesmo e tão limitado pela sua própria vontade revelada que não deve ser adorado segundo as imaginações e invenções dos homens” (Capítulo 21; I – trecho). Este símbolo de fé reformada nos reapresenta, em sua linguagem própria, o princípio regulador do culto. Ele também é igualmente claro ao nos apresentar elementos do culto: a oração, a leitura das Escrituras, a pregação da Palavra, os cânticos de salmos, a recepção e administração de sacramentos, os votos, os jejuns solenes e as ações de graças.
Embora seja comum ouvirmos falar sobre a santidade do culto, além de diversas defesas e controversas sobre o que se pode ou não fazer quando a igreja está reunida em adoração, pouco se tem escrito sobre a natureza espiritual do culto. Semelhante ao que meditamos sobre a santidade, aqui, a natureza espiritual de Deus deve ser refletida no caráter do verdadeiro adorador: “Deus é espírito; e importa que os seus adoradores o adorem em espírito”… (João 4:23a); Paulo Anglada, comentando esta passagem nos diz: “Em espírito, no Novo Testamento, contrasta com o termo na carne, e denota a natureza espiritual do culto, em contraste com a mera aparência exterior. Aponta para o coração, para a natureza íntima do homem”.
Sendo assim, cultuar faz parte da manifestação autêntica de quem foi intimamente transformado pelo Espírito. Se todos os elementos do culto estiverem presentes, mas faltar-lhes o Espírito de vida, a adoração será morta. É importante, então, continuar refletindo no tipo de preparação (e nós faremos isso aqui nas próximas semanas) que deve guardar o coração daqueles eleitos que procuram encontrar-se fiéis (Efésios 4:30; 5:18) – estes elementos internos e não externos do culto, para que não tenhamos que ouvir, a nosso respeito, esta triste declaração do Senhor: “este povo se aproxima de mim e com a sua boca e com os seus lábios me honra, mas o seu coração está longe de mim, e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, que maquinalmente aprendeu”. (Isaías 29:13).
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